O conceito de arte bruta é uma tentativa da psicanálise de delimitar e entender a produção estética de pessoas com problemas psiquiátricos. Arte bruta é a manifestação do inconsciente, é quando se faz arte sem conhecê-la, sem a noção de sua história ou de suas referências. Arte bruta refere-se ao que a mente é capaz de produzir sem a interferência do mundo exterior. É um conceito estranho. Um entendimento que parece vir imbuído de algum preconceito com o fazer artístico de pessoas que, a rigor, não estariam aptas a tal.
Arte bruta é o que Moacir faz. Moacir é pobre, analfabeto, camponês. Mora no Povoado de São Jorge, um pequeno lugarejo no interior de Goiás. Moacir também tem problemas para se comunicar, além de alguma disfunção psiquiátrica que o mantém num mundo à parte e ao que parece, envolto em alucinações. É dessas visões que Moacir retira grande parte das imagens que desenha e pinta.
Nesse documentário de Walter Carvalho, Moacir não tem sobrenome. Pode até parecer apenas um detalhe, mas a omissão do sobrenome mostra uma escolha importante sobre o “biografado”. É uma escolha que reafirma a condição de quase anonimato do personagem.
Moacir sabe assinar seu nome. E ele o faz em cada desenho que termina. A câmera, por muitas vezes, mostra esse ato, em linhas brutas. Um gesto simples que também diz muito sobre ele. Naquele nome mal traçado de Moacir, sem perceber o espectador faz toda uma conceituação, ou melhor dizendo, uma pré-conceituação.
Moacir – Arte Bruta é o segundo documentário assinado por Walter Carvalho. O primeiro foi Janela da Alma e foi feito em parceria com João Jardim. Nesse segundo, Walter Carvalho abre mão da função que lhe é mais cara dentro do cinema, da função que o tornou referência no cinema nacional contemporâneo, a direção de fotografia. Ele assinou a luz de filmes como Terra Estrangeira, Abril Despedaçado, Lavoura Arcaica, Amarelo Manga e Madame Satã. Em Arte Bruta, é Lula Carvalho, seu filho, quem faz a fotografia.
Arte Bruta não tem a profundidade – nem estética, nem de conteúdo – que Janela da Alma possui. A polifonia de depoimentos do primeiro documentário desta vez é substituído por um pequeno punhado de entrevistados. Todos eles tentando explicar de onde vem a arte de Moacir. O próprio Moacir fala no filme, mas é uma fala entrecortada, confusa, repetitiva. Dialeticamente, trabalha-se a noção que o povoado tem sobre Moacir e sua pintura.
O sexo é dominante na obra de Moacir. São representações humanas que lembram em muitos momentos expressões de algumas tribos africanas. Olhos/vaginas que se multiplicam por muitas telas; demônios que parecem ser o carro chefe de sua propaganda junto ao povoado. Demônios que assustam e encantam o povo da região. Sua casa é uma espécie de outdoor, com pinturas grandes que se espalham pelo lado de fora e que de longe são um chamariz para os turistas que por ali passam e compram seus trabalhos. É com a venda desses desenhos que se sustenta a família: Moacir, sua irmã e seus pais. São eles que falam sobre seus desenhos e sobre a vida de Moacir. Além deles, alguns vizinhos.
Walter Carvalho descobriu os desenhos de Moacir como muitos que por lá passam. No início da década de 90, de passagem, viu um pequeno desenho em um bar da região. Soube de sua história e procurou conhecê-lo. Fez uma foto de Moacir e sua família, ainda morando em uma casa de palha. É um dos primeiros momentos do filme, quando Walter Carvalho mostra a foto feita há 13 anos e pergunta se Moacir lembra da ocasião.
Há um outro plano significativo no documentário, quando Moacir, em casa, assiste TV. O sinal é ruim e em meio ao chuviscado é exibido um programa que leiloa pinturas. Não há como saber se toda a atenção que Moacir dá ao programa é apenas pelo fascínio que a televisão costuma exercer ou se é pelo contato com a pintura de outro autor. São flores e marinhas, pinturas meramente decorativas.
Moacir não sabe, mas nesse documentário ele é a representação de um mundo exótico, algo parecido com o que acontecia na época das grandes navegações, na época em que o Velho Mundo ficava fascinado com o que era descoberto por estas terras. Esta afirmação não toma aqui um caráter meramente pejorativo. No entanto, a força de Moacir – Arte Bruta está mais no estranhamento do público com esse personagem do que na obra em si. De alguma forma, é como se fôssemos europeus fascinados com um mundo desconhecido, um mundo fundado sobre crenças e medos.
Arte bruta é o que Moacir faz. Moacir é pobre, analfabeto, camponês. Mora no Povoado de São Jorge, um pequeno lugarejo no interior de Goiás. Moacir também tem problemas para se comunicar, além de alguma disfunção psiquiátrica que o mantém num mundo à parte e ao que parece, envolto em alucinações. É dessas visões que Moacir retira grande parte das imagens que desenha e pinta.
Nesse documentário de Walter Carvalho, Moacir não tem sobrenome. Pode até parecer apenas um detalhe, mas a omissão do sobrenome mostra uma escolha importante sobre o “biografado”. É uma escolha que reafirma a condição de quase anonimato do personagem.
Moacir sabe assinar seu nome. E ele o faz em cada desenho que termina. A câmera, por muitas vezes, mostra esse ato, em linhas brutas. Um gesto simples que também diz muito sobre ele. Naquele nome mal traçado de Moacir, sem perceber o espectador faz toda uma conceituação, ou melhor dizendo, uma pré-conceituação.
Moacir – Arte Bruta é o segundo documentário assinado por Walter Carvalho. O primeiro foi Janela da Alma e foi feito em parceria com João Jardim. Nesse segundo, Walter Carvalho abre mão da função que lhe é mais cara dentro do cinema, da função que o tornou referência no cinema nacional contemporâneo, a direção de fotografia. Ele assinou a luz de filmes como Terra Estrangeira, Abril Despedaçado, Lavoura Arcaica, Amarelo Manga e Madame Satã. Em Arte Bruta, é Lula Carvalho, seu filho, quem faz a fotografia.
Arte Bruta não tem a profundidade – nem estética, nem de conteúdo – que Janela da Alma possui. A polifonia de depoimentos do primeiro documentário desta vez é substituído por um pequeno punhado de entrevistados. Todos eles tentando explicar de onde vem a arte de Moacir. O próprio Moacir fala no filme, mas é uma fala entrecortada, confusa, repetitiva. Dialeticamente, trabalha-se a noção que o povoado tem sobre Moacir e sua pintura.
O sexo é dominante na obra de Moacir. São representações humanas que lembram em muitos momentos expressões de algumas tribos africanas. Olhos/vaginas que se multiplicam por muitas telas; demônios que parecem ser o carro chefe de sua propaganda junto ao povoado. Demônios que assustam e encantam o povo da região. Sua casa é uma espécie de outdoor, com pinturas grandes que se espalham pelo lado de fora e que de longe são um chamariz para os turistas que por ali passam e compram seus trabalhos. É com a venda desses desenhos que se sustenta a família: Moacir, sua irmã e seus pais. São eles que falam sobre seus desenhos e sobre a vida de Moacir. Além deles, alguns vizinhos.
Walter Carvalho descobriu os desenhos de Moacir como muitos que por lá passam. No início da década de 90, de passagem, viu um pequeno desenho em um bar da região. Soube de sua história e procurou conhecê-lo. Fez uma foto de Moacir e sua família, ainda morando em uma casa de palha. É um dos primeiros momentos do filme, quando Walter Carvalho mostra a foto feita há 13 anos e pergunta se Moacir lembra da ocasião.
Há um outro plano significativo no documentário, quando Moacir, em casa, assiste TV. O sinal é ruim e em meio ao chuviscado é exibido um programa que leiloa pinturas. Não há como saber se toda a atenção que Moacir dá ao programa é apenas pelo fascínio que a televisão costuma exercer ou se é pelo contato com a pintura de outro autor. São flores e marinhas, pinturas meramente decorativas.
Moacir não sabe, mas nesse documentário ele é a representação de um mundo exótico, algo parecido com o que acontecia na época das grandes navegações, na época em que o Velho Mundo ficava fascinado com o que era descoberto por estas terras. Esta afirmação não toma aqui um caráter meramente pejorativo. No entanto, a força de Moacir – Arte Bruta está mais no estranhamento do público com esse personagem do que na obra em si. De alguma forma, é como se fôssemos europeus fascinados com um mundo desconhecido, um mundo fundado sobre crenças e medos.