Reconstruindo um viver
Há algo que norteia e unifica o cinema argentino contemporâneo. Em geral, essa nova safra de filmes tenta identificar a cultura de seu povo, seus problemas financeiros, suas pequenas e grandes mazelas. Em Conversando com Mamãe, de Santiago Carlos Olves, não é diferente. O filme, através de um microcosmo, de uma única relação familiar, pretende radiografar as relações do povo argentino com a periclitante situação financeira exposta ao mundo pelos panelaços de 2001.
E essas são as primeiras imagens de Conversando com Mamãe, cenas gravadas em vídeo dos protestos que arrebataram o país e culminaram na fuga do então presidente Fernando de la Rúa. Assim, a primeira escolha de Santiago Carlos Olves é a utilização do vídeo. Não apenas porque é nesse formato que encontram-se as imagens dos protestos, mas porque com a falta de precisão das imagens, com o vídeo trêmulo das reportagens, Conversando com Mamãe agrega um valor histórico e irretocável. Aquela pouca resolução típica de imagens captadas em vídeo diz, “foi isso que nos aconteceu”, e não é preciso explicar mais nada.
No âmbito ficcional de Conversando com Mamãe, vê-se a reaproximação do filho Jaime com a mãe octogenária. Jaime é interpretado por Eduardo Blanco, conhecido no Brasil pelo seu papel em O Filho da Noiva, de Juan Jose Campanella. A mãe fica a cargo de China Zorrilla. Mãe e filho se reencontram para reconstruir uma relação, assim como o país que inicia sua reconstrução, em meio à crise; assim como a mãe, que aos 82 anos tenta recomeçar, com um namorado; assim como Jaime, que recomeçará, com um divórcio. Essa vontade de reinício é uma constante nesta crônica da Argentina.
Dentre os personagens explorados, o único que parece estar preso a um antigo país e seu modo de vida é a mulher de Jaime, Dorita (Silvina Bosco). Neste ponto o filme demonstra uma visão um tanto maniqueísta, mas serve para ilustrar a dor de uma classe média empobrecida, que agonizava as perdas do status e do padrão de vida. Há um diálogo que explicita bem esse conflito, quando Jaime tentando salvar o casamento se reaproxima da mulher. Ela o explica que sua infelicidade está nessa nova vida que é obrigada a viver. Ela refere-se às privações financeiras, ao fato de ter tido o carro da família vendido, aos projetos de se desfazer de um segundo apartamento e de, provavelmente, precisar se mudar para outro país. Tudo motivado pelo recente desemprego do marido.
Vender um apartamento não seria necessariamente um problema, mas o complicador da questão está no fato de que a mãe de Jaime mora de favor no imóvel. Jaime, então, vê-se obrigado a todos os dias visitar a mãe, na tentativa de convencê-la a ir morar com ele para, desse modo, poder se desfazer do bem. É nessa nova rotina que Jaime reencontra a mãe, revive seu passado e redescobre valores que para ele estavam perdidos.
Conversando com Mamãe tem a grandeza de apresentar atuações e diálogos coerentes e recheados de vida. Quem mora na distância da família saberá identificar bem esses elementos de conversas que só o tempo e a ausência criam. Por outro lado, o que existe de belo e verdadeiro no texto, perde-se quase que completamente quando o diretor Santiago Carlos Olves ousa cinematograficamente. Na tentativa de fazer uma crônica não só política e familiar, mas poética e lírica, o filme sucumbe a cada flash-back. Porque o resultado é por demais didático e piegas. Deveria ter acredito na força do texto e deixado o preto e branco e o sépia, para outra ocasião.
quarta-feira, setembro 07, 2005
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4 comentários:
Faz três filmes que estou esperando um que eu tenha assistido!!!!!
Lex
é muito singelo e belo.
Ha ha ha procê também. E claro que não é ficção. Cadê tu, tatu?
Tô te esperando nos imeios. E vê se não demora, que eu tô morrendo de saudades.
beijos
S.
puxa, eu gostei dos flashbacks! mas eus ou um tipo piegas mesmo.
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